segunda-feira, 31 de julho de 2017

Madredeus e Thomas Pynchon com o seu arco-íris gravitacional alimentam minha cachola nesta segunda de manhã.
Início da semana é sempre tenso, a perspectiva certa e um tanto sombria de cinco dias de trabalhos ininterruptos. Cinco vezes sete, trinta e cinco horas tentando tornar o mundo - que é basicamente composto de psicóticos e degenerados - um lugar um pouco melhor. Se as pessoas fossem boas e honradas não haveria necessidade de se judicializar e processar tanto. Talvez eu esteja sendo precipitado na minha análise, mas esse não é o lugar certo para ser apressado mesmo, um blog de mei'horinha que, inclusive, é lido apenas pelo próprio autor (e somente enquanto o escreve)?!

Variações Goldberg, de Bach, por Glenn Gould. Mistura explosiva de êxtase e melancolia! Obra que traduz o sentimento pelo mundo: ora nos arrebata de felicidade com seu variegado esplendor, ora nos põe em estado depressivo, e então nos recordamos, aterrorizados, da imundície da sociedade excludente em que vivemos.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

A liberdade em relação à opinião alheia começa com a liberdade em relação à própria opinião. Há um tirano em nós, com a voz imponente, que se acha invencível, intransponível. Esse ditador interno é filho do passado - forjado no fogo dos acontecimentos pretéritos - e pode nos ajudar muitas vezes (como realmente faz), mas o que acontece, o que não devemos esquecer, é que a vida é mutante e que situações novas e complexas exigem atitudes igualmente novas e complexas. Prepare-se: você precisará guilhotinar o seu ditador algumas vezes.

Estes poucos cômodos, este espaço é tudo de que preciso. O espaço-laço que me une a mim. Da porta de casa pra rua, pra fora, é um universo estranho, de pontas, arestas onde me arranho. Este meu espaço é tudo, macias, estas paredes de veludo. Volto pra casa, e me dou um abraço carinhoso, o ápice do dia, sempiterno gozo.

Por mais que tente fugir do poema, a minha escrita está sempre impregnada de rimas. Inconscientemente me encaminho para o carinho do verso. Mesmo que eu tome outro rumo, meu GPS interno sempre aponta para um norte poético. Como se as palavras só conseguissem ser retiradas do caldeirão fervilhante da possibilidade para estarem finalmente no papel se impulsionadas por uma associação musical, rítmica. Eis a minha limitação.
Por isso (penso agora) me parece tão difícil manter uma conversação comum, cotidiana. Minha cabeça precisa sintonizar a música interna para poder se expressar. E acaba que, no correr da vida, não há tempo para esse tipo de procedimento. As coisas devem ser ditas num espaço curto, as coisas devem ser feitas, não há tempo para a tentativa de beleza, para as palavras eleitas. Minha vida diária assim como a sua devem ser servidas sem tempero - e cruas.   

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Para cumprir a obrigação diária de escrever.
Sabe, eu nunca gostei das obrigações. Ainda mais em matéria de algo que deveria ser um exercício de libertação da alma, como é a escrita. Mas, sei lá, eu até consigo entender - agora - que realmente preciso forçar a inspiração. Caso contrário, daqui a pouco faço setenta anos sem ter escrito nada.

Em certo sentido a Língua Portuguesa é uma cadeia. Veja, inclusive para escrever a sentença anterior, acabei tendo de recorrer à pesquisa googleana para elucidar: escrevo "Língua Portuguesa" ou "língua portuguesa"? Descobri que o Novo Acordo Ortográfico (até onde a minha paciência de pesquisar me permitiu ir) deixa o uso de maiúsculas/minúsculas nesses casos ao gosto do escritor. Acabei, por fim, adotando a minha ideia inicial de como redigir a expressão (seja o que Deus quiser). É essa a cadeia de que eu falava; muitas vezes a gente fica tão entrelaçado no apuramento da correção da escrita que acaba se perdendo do objetivo principal, que é a ideia que se deve/quer passar. A forma é a vestimenta, o conteúdo é a pessoa: vale mais a roupa ou a pessoa que a veste?

A solidão vicia.
Sou o maior conterrâneo e contemporâneo de mim.
Meu ego se acaricia,
sessões de uma autofagia sem fim.  


quarta-feira, 26 de julho de 2017

A última hora. Realize e construa como se fosse a última hora. Mas o faça como se as suas realizações fossem ecoar no mundo depois da sua partida. Se assim não for, de que vale o empenho?!

Os homens e seus afazeres diários. O mesmo deslocamento. Os mesmos sorrisos, os mesmos cumprimentos, as mesmas indiferenças. Idas, voltas, deslocamentos pendulares sem fim. Somos esses bumerangues, sim, até o último dia. 

Por isso, edificar algo além do cotidiano é tão importante. Nos tira essa sensação esmagadora de correr na esteira, de não chegar a lugar algum. Esta é a grande virtude da Arte: retira o homem do trivial e o presenteia com o extraordinário.

Sentar durante, ao menos, uma hora, produzir o que quer que seja. Essa ideia me martela a cabeça. E ao mesmo tempo que me atrai, me causa medo. Atrai porque eu sei que somente assim me sentirei realmente completo; me causa medo porque eu tenho a sensação de que posso nunca conseguir escrever algo que me faça sentir completo.
Por outro lado, verifico: completos, somente os mortos. De modo que posso abandonar a ansiedade da completude e me conformar em escrever fragmentos impuros quaisquer. Dá pra pensar também que até os grandes um dia foram pequenos. Ou que é engatinhando que se começar a andar.